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Quanto custa uma decisão por órgão de controle aos 45 do segundo tempo?

As empresas privadas podem não mais se interessar pelo projeto em razão dos recursos que teriam que ser novamente despendidos


Isadora Cohen

Ana Carolina Sette

Felipe Schwartz


Publicado orginalmente no JOTA


Há muito não se via uma decisão proferida por um Tribunal de Contas na véspera da licitação como a exarada pelo Tribunal de Contas do Município de São Paulo na segunda-feira (21), que, em decisão cautelar, emitiu às 18h um ofício suspendendo a sessão de licitação que estava marcada para o dia seguinte, terça-feira (22), às 9h.


Somada à paralisação de obras públicas Brasil afora, a práxis de suspensão de certames licitatórios às vésperas de sua realização – iniciada pelo Tribunal de Contas da União, mas que, ao longo dos anos, foi sendo replicada pelos demais entes estaduais e municipais - trouxe enormes prejuízos aos cofres públicos e foi objeto de críticas veementes pelos atores da área. Gradualmente, os órgãos de controle, felizmente, passaram a apontar irregularidades ou opinar sobre os projetos de forma antecipada.


Porém, na contramão das análises prévias, o TCM de São Paulo proferiu decisão determinando a suspensão do certame relativo à parceria público-privada, na modalidade concessão administrativa, lançada pela Secretaria do Governo Municipal e Secretaria Municipal de Educação, para requalificação e conservação das unidades educacionais da DRE São Mateus, na zona leste da cidade de São Paulo, pelo período de 25 anos.


A iniciativa, pioneira no País, prevê a requalificação das Escolas, assim como a ampliação da infraestrutura escolar para o oferecimento de ensino integral, atividades culturais e esportivas, além da ampliação da oferta do Ensino Superior, por meio da UniCEU, em uma das regiões de maior vulnerabilidade da Cidade de São Paulo. Por tudo isso, todos que acompanham o setor tiveram frustrada a expectativa de testemunhar a concretização de um projeto inovador e com potencial para inaugurar verdadeira revolução na qualidade da infraestrutura educacional na cidade e, como acontece com projetos bem-sucedidos, posteriormente ser replicado Brasil afora e ajudar a mudar a qualidade da infraestrutura educacional pública no país.


A origem do processo é uma representação feita por um vereador, sob a alegação de restrição de acesso ao processo SEI (Sistema Eletrônico de Informações) no âmbito do qual tramita o projeto, “o que inviabiliza qualquer análise de viabilidade técnica ou razoabilidade das condições estabelecidas no Edital de Concorrência e seus respectivos Anexos desatendendo garantias legais e constitucionais de acesso à informação; questiona, ainda a formação do valor estimativo da licitação e do valor do aporte, sob o argumento de que não restaram demonstrados os custos estimados, ausência de inventário de bens e a não obrigatoriedade da visita técnica”.


A partir da Representação, foram apontadas 35 irregularidades pelo TCM-SP, a maioria a respeito da citada ausência de justificativa para itens pertinentes à modelagem do projeto - o que parece se tratar, em verdade, de decisões tomadas pelos gestores públicos dentro do seu espectro de competência e conveniência, parte da política pública estruturada pelo Poder Executivo.



Antes de qualquer apontamento quanto à suposta concentração de unidades em um único bloco, motivando a interrupção abrupta de um processo licitatório iminente, é preciso compreender diversos aspectos que permeiam a escolha feita pelas Secretarias, entre eles o fato de que a rede municipal paulistana tem 13 Diretorias Regionais de Educação e de mais de 1.500 instituições de ensino infantil, fundamental e médio. Pelo que se tem conhecimento, as 90 escolas que compõem o bloco licitado estão sob administração da mesma Diretoria Regional de Educação. Assim, considerando que se trata de projeto piloto (as 90 escolas representam cerca de 5% de toda a rede de ensino) não há indícios de qualquer irrazoabilidade em concentrar o projeto piloto em uma mesma Diretoria de Ensino e em um único bloco, permitindo inclusive absorver ganhos administrativos da redução de números de contratos gerenciados, entre outros. Quando se acrescenta o fato que a área de atuação da Diretoria de Ensino escolhida é de elevada vulnerabilidade social, aparenta ter sido feita escolha justificável sob o ponto de vista técnico e do interesse público.



A Prefeitura pôde aprimorar o projeto a partir de inúmeras contribuições de entidades privadas e cidadãos interessados no projeto, momento em que poderiam ter sido analisados também os questionamentos suscitados na Representação formulada ao TCM. Parece-nos que a fase de consulta e audiência pública era o foro ideal para contribuições como esta, que facilitam a tomada de decisão por parte do gestor público e permitem o aprimoramento do projeto como um todo.


A arguição tardia de elementos basilares do projeto, que poderiam ter sido discutidos na etapa adequada e com a participação da sociedade e a publicação de uma decisão na véspera do certame provoca significativos prejuízos econômico-financeiros e de imagem ao Município, talvez não considerados pelo TCM. Os custos para a modelagem do projeto, confecção das minutas de edital e contrato, mobilização da Comissão de Licitação repercutem sobremaneira na seara econômico-financeira e na percepção do mercado sobre o projeto e na confiabilidade do processo de projetos de concessão como um todo.


O projeto estava com o Edital publicado há mais de dois meses, sem contar o Procedimento de Manifestação de Interesse, que remonta a setembro de 2021 e já havia atraído empresas interessadas na licitação e preparadas para participar do certame. A partir dos elementos contidos no Edital e definidos pelas Secretarias, foram investidos tempo, recursos e pessoas na elaboração de propostas e na realização de estudos para a participação no certame.


Diante dos apontamentos formulados pelo TCM e da possibilidade de modificação do conteúdo técnico e elaboração de novos estudos, as empresas privadas podem não mais se interessar pelo projeto, em razão, tanto dos recursos que teriam que ser novamente despendidos, quanto pelo risco de impugnação de um novo edital.


Os prejuízos não se limitam ao econômico-financeiro mas, principalmente, a retirada da oportunidade da população da região beneficiada a ter acesso a infraestrutura educacional de qualidade. Some-se a isso o risco do sempre citado “apagão das canetas” ou, em outros termos, da paralisia das decisões públicas. Se o gestor público sofre limitações na execução de suas ações discricionárias e de seu juízo de oportunidade e conveniência, qual será seu ímpeto para modelar projetos inovadores tal como a parceria público-privada em tela?


Pela avaliação de todo esse cenário, nos parece que a decisão do Tribunal Contas do Município de São Paulo relembra um passado não tão distante de interferência tardia em uma esfera que não lhe compete, provoca insegurança no mercado quanto à solidez dos projetos de infraestrutura e, ao fim e ao cabo, prejudica a população paulistana mais vulnerável.

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