Comitês são eficientes para evitar perda de recursos financeiros do Estado
Fernanda Bragança
Fernando S. Marcato
Fernando Marcondes
Juliana Loss
Renata Braga
Publicado no JOTA
O Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da Fundação Getulio Vargas (FGV)[1], coordenado pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e corregedor-geral de Justiça, Luis Felipe Salomão, concluiu pesquisa[2] que buscou identificar e analisar as decisões judiciais no âmbito do STJ, Tribunais de Justiça estaduais e Tribunais Regionais Federais, assim como decisões dos Tribunais de Contas estaduais e Tribunal de Contas da União que tratam de dispute board em contratos de infraestrutura. O estudo faz parte da linha pesquisa de solução de conflitos do Centro de Inovação.
O dispute board, ou comitês de prevenção e solução de conflito, é mais uma abordagem de resolução adequada de disputas que ganhou propulsão no Brasil após experiências exitosas no setor de infraestrutura. Trata-se de um instrumento de gestão contratual que visa acompanhar a execução do contrato, de modo a evitar que este seja paralisado em razão da judicialização do conflito.
O problema da suspensão das obras no Brasil é uma preocupação. Segundo o painel de obras paralisadas do Tribunal de Contas da União (TCU)[3], que consolida os dados de contratos financiados com recursos federais, o país conta com mais de 8.600 obras paralisadas, de um total de cerca de 21 mil obras. Em termos financeiros, estas obras paralisadas mobilizam mais de R$ 32 trilhões de investimentos.
Ainda segundo o painel do TCU, o setor de infraestrutura e mobilidade urbana é o 2º maior em quantidade de obras paralisadas, com cerca de 1.900, o que representa 52,4% do total, e têm um valor previsto de investimento de, aproximadamente, 3,4 trilhões de reais.
Outro setor de grande relevância neste contingente é o de saneamento, com 404 obras paralisadas, cerca de 16% do total, e com um valor previsto de investimento de, aproximadamente, R$ 7 trilhões.
Nesse contexto, os dispute boards se apresentam como uma ferramenta eficiente para permitir a continuidade da execução contratual e evitar perda de recursos financeiros para o orçamento do país.
O estudo contou com os seguintes objetivos: (i) apurar quais os tribunais que enfrentaram questões relacionadas aos dispute boards; (ii) entender as demandas relacionadas ao instituto que são judicializadas, e verificar as características e os padrões mais comuns dessas demandas; (iii) identificar e analisar as decisões que se referem à aplicação de dispute boards em contratos de infraestrutura; (iv) investigar como os tribunais abordam as decisões dos boards, particularmente, se mantiveram ou não as decisões dos Comitês; (v) estimar a proporção de decisões ou recomendações dos comitês que são mantidas pelos tribunais.
O Jusbrasil é um parceiro nesta pesquisa e realizou o levantamento dessas decisões judiciais[4]. A análise individual de cada um desses pronunciamentos identificou que o dispute board em contratos de infraestrutura foi objeto central em 8 decisões, que se restringiram ao âmbito do TCU, TJSP e STJ. O Poder Público é parte em todos estes processos.
Os temas dos boards envolveram, basicamente, a área de transporte, por tratarem, fundamentalmente, de rodovias, metrô e trens. O relatório de pesquisa aprofunda sobre cada um dos processos, com a identificação do assunto, relator, ano da decisão, tema, partes, breve descrição do caso e doutrina citada na decisão.
Em que pese o número ainda pouco expressivo de decisões, o acompanhamento do instituto do dispute board tem relevância, considerados os contratos em que estão inseridos, como o BRT de Belém, nas obras de reconstrução da cidade de Mariana, dentre outros de grande complexidade e com volume de investimento expressivo.
Nos casos em que os tribunais analisaram as decisões dos comitês, elas foram mantidas, o que permite afirmar que os órgãos do Judiciário validam o pronunciamento dos especialistas na matéria que acompanharam, detidamente, a execução do contrato. Trata-se de decisão paradigmática, pois os dispute boards são tidos como instrumentos voluntários.
O Centro do Judiciário reconhece a importância de uma atualização recorrente deste estudo. Em âmbito legislativo, o dispute board ganha atenção em decorrência do PL 2421/2021[5], que tramita na Câmara dos Deputados. O PL regulamenta a instalação de Comitês de Prevenção e Solução de Disputas em contratos celebrados pela União, pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios. A produção de conhecimento e dados sobre o dispute board podem servir de base, também, para a discussão e aprimoramento do PL.
A regulação do instituto é bastante aguardada e tende a fazer com que este método de solução de conflitos seja cada vez mais aplicado em contratos complexos e de longa duração, uma vez que gera maior segurança jurídica na previsão contratual. O impacto desejado é a consequente minimização dos gastos públicos e privados com as paralisações das obras.
Confira o relatório da pesquisa.
[1] Cf. Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da FGV. Disponível em: https://ciapj.fgv.br. Acesso em: 29 nov. 2023.
[3] TRIBUNAL DE CONTAS DE UNIÃO. Painel de acompanhamento de obras paralisadas. Disponível em: https://paineis.tcu.gov.br/pub/?workspaceId=8bfbd0cc-f2cd-4e1c-8cde-6abfdffea6a8&reportId=013930b6-b989-41c3-bf00-085dc65109de. Acesso em: 29 nov. 2023.
[4] Aas seguintes palavras-chaves foram usadas na pesquisa: “board”, “disputa”, “comitê” e “infraestrutura”. A base apurada pelo Jusbrasil continha decisões do TCU, STJ, TJSP, TSE, TJRJ, TJPE, TCE-MG, TJSC, TRF-1, TRF-3, TRF-4, TRT-1 e TRT-4.
[5] CÂMARA DOS DEPUTADOS. PL 2421/2021. Regulamenta a instalação de Comitês de Prevenção e Solução de Disputas em contratos celebrados pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios. Disponível em: https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2289398. Acesso em: 29 nov. 2023.
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