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A urgência dos investimentos em saneamento e seus potenciais benefícios

Insuficiência de investimentos no setor suprime benefícios econômicos, sociais e ambientais que poderiam ser alcançados com saneamento adequado


Isadora Cohen

Victor Medeiros

Luísa Dubourcq


Publicado orginalmente no JOTA


O amplamente conhecido cenário do saneamento básico no Brasil é caracterizado por baixos níveis de cobertura dos serviços, em que cerca de 50% da população não possui acesso à esgoto, e correlacionados baixos níveis de investimentos. Somando esforços públicos e privados, os investimentos anuais no setor se aproximaram de R$ 14 bilhões e são insuficientes para universalizar os serviços na velocidade necessária. Enquanto o montante atual de investimentos em saneamento representa cerca de 0,2% do Produto Interno Bruto (PIB), o valor necessário para a universalização seria de 0,45% do PIB, mais que o dobro.

Como consequência da insuficiência de recursos para o setor, a população, especialmente a mais vulnerável economicamente e aquela isolada das regiões centrais do país, sofre com indisponibilidade de água tratada, ausência da coleta e tratamento de esgoto e, consequentemente, com a incidência de doenças de veiculação hídrica e a degradação do meio ambiente. A necessidade de desenvolver o saneamento se torna ainda mais relevante devido às condições econômicas nos últimos anos, em que se observou estagnação econômica prolongada, tornando o investimento um mecanismo-chave para a retomada da economia nos próximos anos.

De acordo com estudo realizado pela ICO Consultoria para avaliar o potencial dos investimentos necessários para a universalização do saneamento em termos de indução de renda, arrecadação de impostos e empregos, tais investimentos poderiam induzir, no curto prazo e médio prazo, entre R$ 92,67 e R$ 267,4 bilhões de PIB, entre 328 e 947 mil empregos, além de arrecadar entre R$ 11,3 bilhões e R$ 18,24 bilhões de impostos. No caso da manutenção dos atuais níveis de investimentos, os benefícios econômicos não chegariam a 30% daqueles projetados para o cenário de universalização.

Além disso, os investimentos são urgentes. A manutenção de um cenário de baixa cobertura dos serviços implica uma elevada parcela da população que sofrerá com os prejuízos do saneamento inadequado. Os baixos investimentos, por sua vez, deixam de impulsionar a economia em um momento de estagnação. Estima-se que, para cada ano de atraso no cronograma de investimentos necessários para a universalização, gera-se uma perda social (ou ineficiência) de R$ 8,37 bilhões apenas em termos de indução de renda na economia.

Nesse sentido, a universalização dos serviços de saneamento é inadiável e demandará a união de esforços públicos e privados em diversas esferas. Dentre elas, pode-se incluir questões relacionadas ao aprimoramento regulatório e institucional, ao planejamento da regionalização da prestação dos serviços, à inclusão de aspectos ESG nos projetos de saneamento e ao estímulo às concessões e PPPs no setor. Cada um desses pilares, e a união entre eles, tem o potencial de acelerar benefícios econômicos, sociais e ambientais promovidos pelos investimentos em saneamento.

No âmbito da regulação e da qualidade institucional, os benefícios se relacionam à maior atratividade aos investimentos privados e ao aumento da eficiência dos gastos públicos. Dentre potenciais medidas para aprimorar esses mecanismos, pode-se citar a necessidade de criar instrumentos para a mitigação de riscos, o monitoramento e verificação de projetos, a capacitação de servidores para a regulação em entes subnacionais, o estabelecimento de normas de referência da ANA e o apoio técnico especializado para a formulação e acompanhamentos de projetos.

Benefícios adicionais estão conectados à prestação regionalizada dos serviços, gerando economias de escala e de eficiência, com potencial redução de custos e aumento de produtividade por parte dos prestadores, além de permitir uma estrutura efetiva de subsídios cruzados entre municípios superavitários e deficitários. Nesse sentido, é necessário o estímulo ao planejamento da regionalização e a implantação da prestação regionalizada dos serviços.

A universalização do saneamento pode ser ainda mais benéfica à sociedade a partir do estímulo às práticas ESG. O fomento generalizado ao ESG em projetos de infraestrutura desde os processos de planejamento da política pública, no oferecimento de serviços para populações socialmente vulneráveis e na inclusão desses usuários no equilíbrio do sistema por meio do pagamento de preços subsidiados, pode impactar populações econômica e socialmente vulneráveis e gerar benefícios ambientais substantivos.

Com o atingimento das metas de universalização, a expansão da cobertura de esgoto pode impactar 17,3 milhões de brasileiros e brasileiras que atualmente se encontram em situação de pobreza. Similarmente, a universalização tende a reduzir os níveis de desigualdade de renda, uma vez que os pobres são aqueles que mais sofrem com a carência de serviços de saneamento básico no país. Em termos ambientais, o incentivo às práticas ambientalmente corretas, como, por exemplo, o tratamento do lodo de esgoto em compostagem, poderia reduzir milhões de toneladas de CO2 emitidas por ano e, consequentemente, diminuir prejuízos sociais causadas pela poluição do ar e dos rios.

No atual cenário de necessidade de expansão dos investimentos e da geração de benefícios e externalidades positivas com o saneamento, as concessões e parcerias público-privadas (PPPs) têm se mostrado uma solução eficaz para elevar os recursos e trazer ganhos de eficiência no setor. Outra pesquisa da ICO Consultoria levantou os investimentos efetuados em água e esgoto por municípios incluídos em programas de concessões e PPPs no âmbito do Novo Marco Legal[1].

Os investimentos previstos pelas concessões e PPPs nesses municípios representam mais de 3 vezes o valor investido no cenário atual, considerando os últimos 10 anos. Em outros termos, o mesmo montante investido pelas concessões e PPPs entre 2020 e 2030 seria alcançado apenas entre 20 ou 30 anos depois seguindo a trajetória atual de insuficientes investimentos. Consequentemente, os benefícios e externalidades econômicas, sociais e ambientais do saneamento também seriam intensificados no cenário de maior investimento.

A necessidade e urgência de se aumentar os investimentos no setor de saneamento é consensual. Os benefícios e as externalidades positivas mensuráveis do saneamento básico adequado são vastos, e tendem a beneficiar mais a população carente e periférica do país em um momento em que a economia precisa de estímulos. Caso a trajetória de investimentos dos últimos anos persista, o país percorrerá longas décadas de prejuízos sociais, econômicos e ambientais causados por uma infraestrutura de saneamento insuficiente, de baixa qualidade e que não inclui a população mais pobre.

Para que o trajeto do saneamento básico brasileiro mude, o aprimoramento regulatório e institucional, o planejamento da regionalização dos serviços, o estímulo às práticas ESG é fundamental. Tais fatores formarão um ambiente adequado para a entrada da iniciativa privada no setor, e uma maior eficiência dos gastos públicos, gerando um ciclo virtuoso de expansão dos investimentos e dos benefícios esperados com o desenvolvimento do saneamento no país.

[1] Foram incluídos os municípios contemplados nos projetos de Parcerias Público-Privadas no setor de saneamento básico realizados a partir da aprovação do novo marco regulatório do setor, em 2020, nos estados de Amapá, Ceará, Pernambuco, Alagoas, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul. Cumpre destacar que, no caso da concessão da Região Metropolitana do Recife, a concessão originária é anterior à aprovação do novo Marco do Saneamento Básico (firmada em 2013), todavia, a delegação sofreu inúmeros aditivos contratuais recentes, inclusive com o fim de adequá-la à nova norma.

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